Cósmico leitor,
Algumas histórias não são feitas para serem gritadas. São aquelas que a gente quase não percebe lendo… mas que ficam com a gente depois. Aquelas onde o silêncio tem mais peso que o grito. Hoje, te trago um conto sobre uma vila onde ninguém mais sabia falar, mas todos tinham muito a dizer.
Espero que, entre as entrelinhas, você também se escute.
A Vila das Palavras Não Ditas
Diziam que, na Vila de Sereno, ninguém falava há gerações. Não porque não pudessem. Mas porque esqueceram como.
Não havia voz que ousasse quebrar o ar morno da manhã,
nem risos soltos, nem brigas barulhentas… Somente olhares demorados e cartas nunca enviadas.
Lá, os sentimentos eram depositados em pequenos envelopes de papel que se dissolviam ao toque da água. Cada morador deixava os seus à beira do lago central,
onde o vento, às vezes, levava os mais leves.
As crianças aprendiam desde cedo que o silêncio era um idioma. O toque no ombro dizia “estou com você”, uma flor no batente era “me perdoa” e os olhos baixos, “não sei como te dizer isso”.
Mas tudo mudou quando chegou Ayla. Ela não sabia da tradição.
Viera de longe, fugida de vozes que a feriam e palavras que não se apagavam.
Na vila, encontrou um alívio… e um estranhamento.
Ninguém respondia às suas perguntas.
Ninguém acolhia seu riso alto.
Ninguém pedia nada.
Mas ela sentia.
Sentia que ali havia histórias demais guardadas em silêncio.
Na primeira noite de lua cheia, Ayla fez algo inesperado.Pegou um papel, escreveu um “eu te escuto” e o lançou ao lago.
No dia seguinte, encontrou um papel molhado na soleira da porta: “Eu nunca soube como dizer isso, mas eu perdi alguém. E fiquei.”
Desde então, os moradores começaram a escrever de novo e as palavras voltaram como sussurros em folhas amassadas, frágeis, mas verdadeiras.
A voz, aos poucos, retornou à vila. Não como antes… não para preencher o silêncio, mas para atravessá-lo com cuidado.
E você, cósmico leitor? Quais palavras ainda não foram lançadas ao seu lago?
Entre versos e universos
Julia Abreu

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