Mais uma segunda-feira

A decepção começou logo cedo, quando acordei com um grilo dando discurso motivacional na minha janela tirando tudo que eu chamava de paz.
— Levanta, guerreira! O universo te ama!
Só consegui responder:
— Será?

Eu ainda estava com medo do dia começar, porque quando segunda-feira começa, ninguém está seguro.

No caminho pro trabalho, um samurai apareceu na minha rua como se estivesse procurando um Wi-Fi celestial. Disse que precisava de mim para uma incumbência divina enviada por Deus.
Eu, atrasada e segurando uma banana, só consegui pensar que segunda-feira é realmente a proliferação da desgraça humana.

Ele explicou, muito veemente, que a missão envolvia derrotar um monstro feito de ansiedade que estava roubando a alegria das pessoas do bairro.
— Eu? — perguntei. — Eu mal consigo viver com o boleto da energia.
— Mas você tem sabedoria — respondeu o samurai. — E também carrega um item sagrado.

Olhei pra banana.
— Isso?
— Sim. É uma katana frugal.

Antes que eu processasse, o monstro apareceu. Era uma criatura enorme, translúcida, com olheiras profundas e um crachá escrito “TRABALHO EM TEMPO INTEGRAL”.
Socorro — murmurei.

O samurai avançou, eu atrás, segurando minha banana como quem segura um diploma que nunca serviu pra nada.
No meio da luta, a criatura lançou sua pior arma:
— Prazo reduzido, aumento de demanda e NENHUMA validação emocional!
Quase desmaiei.

Pra piorar, um vendedor ambulante surgiu do nada tentando me empurrar um suco azul dizendo que “trazia segurança emocional”. Eu recusei com toda a minha paciência restante (zero).

Enquanto isso, o samurai berrava:
— Ressignificar! Ressignificar!
Não sei se era técnica ancestral ou só desespero mesmo.

No momento final, percebi um dos detalhes importantes: O monstro parecia sensível a demonstrações de amor.
Então taquei a banana nele.

Explodiu.
Simplesmente explodiu em glitter e pequenos boletins escolares dizendo “você deu o seu melhor”.

O samurai me olhou, impressionado.
— Você salvou o lar de todos.
— Eu só estava irritada — respondi, honesta.

Exausta, pedi descanso, mas ele insistiu que eu havia sido escolhida pela antiga profecia da “Guerreira Desanimada, porém Determinada”.
Eu só queria um café.

A criatura derrotada deixou cair uma sentença escrita em papel dourado “Que suas pequenas felicidades sejam maiores que o caos.”
Joguei no bolso sem ler direito.

O samurai tentou me oferecer um treinamento avançado, mas recusei:
— Já chega de tentativa de heroísmo por hoje. Minha única inspiração agora é um banho quente.

Voltei pra casa suada, toda confusa… mas até que orgulhosa.
O grilo me esperava.
— E aí? Salvou o mundo?
— Salvei. Agora cala a boca.

E foi isso. Sem moral da história, ou jornada do herói.
Só mais uma segunda-feira completamente fora do controle… Do jeito que a vida gosta.

Imagem ilustrativa gerada com IA para fins visuais.

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Fragmentos Literários

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