A Concórdia dos Opostos

 

Em algum ponto entre o esquecimento e a nostalgia, Léo e Mariana se reencontraram. Ele, um pintor de quadros abstratos, vivia de recomeços. Ela, uma arquiteta pragmática, sempre soube que a superfície das coisas era apenas uma casca. O primeiro encontro, anos antes, tinha sido um desastre adorável. Eles eram a definição de duas pessoas totalmente opostas, duas almas em um emaranhado de idiossincrasias. Ele sonhava com um reino encantado, ela fazia listas de mercado e cronogramas de obras.

Seu retorno à vida dela, depois de um hiato de cinco anos, foi um susto. Ela estava em um café, rabiscando plantas de um novo projeto. A porta se abriu e o sininho tilintou, anunciando a entrada de um homem alto e desajeitado, de casaco sujo de tinta. O coração de Mariana, que ela pensava ser à prova de bombas, deu um salto e um arroto sonoro. Ele a viu, e um sorriso familiar, que fazia seus olhos ficarem oblíquos, iluminou o seu rosto. “Léo…”, ela murmurou, a caneta caindo de seus dedos.

 

opostos

 

Ele se aproximou, e o silêncio que se instalou entre eles era tão denso que um mastodonte poderia caminhar sobre ele. A confiança de Mariana estava fragilizada, mas a curiosidade venceu. Léo a convidou para um café. A conversa fluiu, cheia de pausas e de memórias insossas de um tempo que já não existia. Léo contou que tinha ido morar na Estônia por um tempo e que tinha um estúdio que cheirava a aguarrás e a café velho. Ela riu, uma risada que era uma gargalhada completa, daquelas que dobram a gente no meio.

Eles se reencontraram no dia seguinte, e no outro, e no outro. O ar entre eles vibrava de uma nova paixão. Léo notou a morena que ela havia se tornado, com um corte de cabelo que a deixava ainda mais linda e os olhos mais expressivos. Ele a levou para um haras, onde podiam caminhar entre os cavalos e sentir o cheiro de feno. Mariana, que sempre foi uma pessoa de cidade, sentiu uma alegria genuína ao ver a forma como os animais se aproximavam dele. Léo, por sua vez, a achava a pessoa mais linda do mundo, uma estrela que brilhava para ele.

Um dia, enquanto almoçavam, ela viu uma lagartixa na parede. Léo, sabendo do medo que ela tinha, estendeu a mão para ela com um sorriso. Era um gesto de generosidade e de puro amor, uma pequena metamorfose na vida dela. Ele, que era o caos em pessoa, era sua inspiração. A mudança neles era perceptível. Léo, antes um artista recluso, se abriu para o mundo. E Mariana, a arquiteta controladora, finalmente se permitiu sentir as borboletas no estômago.

A vida era cheia de surpresas, de momentos efêmeros que tinham um peso eterno. A coragem de se abrir um para o outro, de deixar as mágoas para trás, era o que eles precisavam. A sorte estava do lado deles. Um dia, Léo, sentou-se em um tamborete de seu estúdio, e pintou-a. O quadro era um borrão de cores vibrantes, mas o que ele pintou não foi a imagem dela, foi a essência. Era a concórdia de dois mundos diferentes.

Mariana, por sua vez, estava se tornando uma exímia observadora dos detalhes de sua vida. Ela era finalmente autêntica. O arremate de toda essa história foi quando Léo a pegou de surpresa, um dia, e a levou para o campo. Ele se ajoelhou, em meio a um milharal. Ele não tinha anel, nem um discurso de roteiro de filme, apenas a paixão em seus olhos. E ela, com um sorriso de orelha a orelha, pulou em seus braços.

Essa gargalhada que ecoou pelo campo foi o som mais bonito que eles poderiam ter ouvido, o som de dois corações que se encontravam novamente. Era o começo de uma nova história, onde a guria meiga e o pintor desajeitado viveriam, finalmente, em seu próprio reino encantado. Onde, juntos, aprenderiam a viver com as idiossincrasias um do outro, a rir de seus próprios arrotos e a admirar os cavalos que pastavam, enquanto um oblíquo raio de sol iluminava a concórdia que finalmente existia entre eles.

 

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